A review by uderecife
As Farpas II by Ramalho Ortigão

3.0

Os textos inclusos nesta antologia, intitulada As Farpas II, cobrem o período que vai de janeiro de 1911 até setembro de 1914.

Neles encontramos o mesmo Ramalho Ortigão das primeiras Farpas, capaz de descrever em grande detalhe os quadros de uma sociedade complexa, nunca perdendo a oportunidade de lançar, aqui e além, com humor subtil, as farpas das críticas que vai julgando necessárias.

Mas este é também um Ramalho Ortigão bem mais velho e frustrado, quer com vida quer com os rumos que o seu país tomou. Se antes era ao povo e à sua paisagem que ia tirando retratos, aqui os visados são os artolas que a partir de 1910 se instalaram no poder do país. É que, monárquico, Ortigão está de corpo e alma contra os (ir)responsáveis pela revolução republicana. Para ele, esta revolução não passou de uma fantochada, ridícula em seus propósitos, ilegítima quando ao sentimento geral da nação.

Mas aqui também, nestas farpas, como nas primeiras, de novo somos transportados para um tempo que, embora perto, tão longe já de nós ficou. É nisto que Ortigão é um autor exímio. Não nos sentimos a ver esse então como que à distância — não; mas, com ele, a nos sentirmos como que perante o drama de um país que se tenta reinventar, atropelando com isso não só a sua história, mas também as suas tradições.

E à distância desse tempo, com a distância que só o tempo o permite ter, percebemos o quanto o Portugal político sempre foi reles. Querendo parecer grande, imitando, para isso, o que lhe parece grande, mais pequeno fez o quão pequeno já de si era.

Neste sentido, ler Ortigão, pelas farpas, não é fazer turismo ao passado pitoresco de um país que, de mudado, se perdeu, mas conhecer o presente pela herança cultural que esse passado nos legou. Se a isto somarmos a apurada arte com que Ortigão escreve, não só são As Farpas fáceis de ler, como um ótimo entretenimento. Valem, por isso, o tempo que se lhes gaste na visita.